quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Mails de despedida

O mail de despedida do Camilo:
Galera, tô indo embora.

Larguei tudo e vou viajar. Dar a "volta ao mundo" (ou ao menos em parte dele)

Vendi o que dava pra vender, emprestei o que podia ser emprestado, me desfiz do que sobrou
Juntei grana, comprei uma mochila e uma passagem aérea, para chegar mais rápido no local de partida.

Viajo com um amigo (Magoo) e começamos semana que vem.
O caminho é mais ou menos assim:
Argentina, Chile, Bolívia, Peru, Equador, Colômbia, Venezuela, Panamá, Costa Rica, Nicarágua, Honduras, El Salvador, Guatemala, México, Alemanha, Rússia, Finlândia, Suécia, Noruega, Dinamarca, República Tcheca, Bulgaria, Hungria, Romenia, Grécia, Croácia, Itália, Tunísia, Argélia e Marrocos...

A duração é de um ano... quem sabe mais, quem sabe menos
O roteiro é tentativo. Tudo pode mudar. Dizem por aí que 
el camino se hace al caminar 
O espírito está aberto, pronto a conhercer os lugares e pessoas que virão.
A idéia é deixar de sonhar e apenas ir. Como escreveu Amir Klink,
"
Um homem precisa viajar. Por sua conta, não por meio de histórias, imagens, livros ou TV. Precisa viajar por si, com seus olhos e pés, para entender o que é seu. [...] Precisa viajar para lugares que não conhece para quebrar essa arrogância que nos faz ver o mundo como o imaginamos, e não simplesmente como é ou pode ser. Que nos faz professores e doutores do que não vimos, quando deveríamos ser alunos, e simplesmente ir ver”.

 O mail de despedida do Magoo:
Gentalha, gentalha, gentalha!
Diria o ditado: "Toda longa jornada começa com o primeiro passo!"

Diria o poeta (T. S. Eliot): 
Porque não mais espero retornar
Porque não espero
Porque não espero retornar
A este invejando-lhe o dom e àquele o seu projeto
Não mais me empenho no .empenho de tais coisas
(Por que abriria a velha águia suas asas?)
Por que lamentaria eu, afinal,
O esvaído poder do reino trivial?

Porque não mais espero conhecer
A vacilante glória da hora positiva
Porque não penso mais
Porque sei que nada saberei
Do único poder fugaz e verdadeiro
Porque não posso beber
Lá, onde as árvores florescem e as fontes rumorejam,
Pois lá nada retorna à sua forma

Porque sei que o tempo é sempre o tempo
E que o espaço é sempre o espaço apenas
E que o real somente o é dentro de um tempo
E apenas para o espaço que o contém
Alegro-me de serem as coisas o que são
E renuncio à face abençoada
E renuncio à voz
Porque esperar não posso mais
E assim me alegro, por ter de alguma coisa edificar
De que me possa depois rejubilar


Diria o romancista (Várquez-Figueroa): 
"Lo peor que puede ocurrirle a un ser humano es no llegar a ser lo que en justicia debería haber sido, sino convertirse en el resultado de una jugarreta del destino, que se divierte trastocándolo todo con la misma inconsciencia con la que un niño se divierte arrancándole las plumas a un canario!"


Diria o poeta dramaturgo (Brecht):
“Há aqueles que lutam um dia; e por isso são muito bons; há aqueles que lutam muitos dias; e por isso são muito bons; há aqueles que lutam anos; e são melhores ainda; porém há aqueles que lutam toda a vida; esses são os imprescindíveis!”


Se somos bons, muito bons, os melhores ou imprescindíveis, eu não sei. Imagino que estejamos mais perto de um meio-termo, do homem comum e corrente, do que me orgulho de ser. Aspirações sempre temos, mas nem sempre encontramos os meios de realizá-las. Camilo e eu, por sorte (mais sorte que juízo, já diria a mãe deste), conseguiremos realizar um sonho que tínhamos (e que muitos têm): o de dar a volta ao mundo. 


Desde que morávamos em Buenos Aires, já tínhamos vontade de fazer uma viagem pela América Latina e mundo. Enquanto vivíamos lá, fomos amadurecendo a ideia. Quando voltamos, já no começo de 2008, decidimos que começaríamos a economizar dinheiro para isso, mas ainda sem data marcada. Tudo em aberto.


No começo deste ano, fomos de carro para o Uruguai e percorremos todo o país, de cabo a rabo, imbiundo-nos daquela gana de viajar mais. Foi então que decidimos, por A mais B, que no final deste ano embarcaríamos para nossa volta ao mundo.


Economizamos mais um ano, orçamos a viagem, organizamos passagens, datas e burocracia. 


Às economias somamos a venda de nossos carros e com isso vamos embarcar numa viagem de quase um ano pela pela América Latina (6 meses), Europa e África, tendo pela frente algumas dezenas de milhares de quilômetros e muita coisa para viver.


No entanto, pelo menos para mim, dar a volta ao mundo não significa somente conhecer um tanto de países, visitar praias, comer comidas diferentes e curtir a vida (carpe diem). Essa viagem é, mais que nada, de são consciência, um marco a ser respeitado e a balizar o futuro. Sei que a vida não será a mesma depois que voltar. Sei que eu mesmo não voltarei o mesmo depois. Na verdade, mal posso imaginar o que estarei pensando, mas sei que, agora, preciso ver coisas para entender, amadurecer e aprender. 


O que se leva da vida é a vida que a gente leva. Sendo assim, o que com certeza posso levar, e é o que tem tido importância para mim agora, é a lembrança do caminho que vou trilhando, porque são as pegadas que for deixando que vão me levar ao que vou ser, ao que posso ser...


Tanta filosofia (de botequim) não quer dizer que farei uma viagem monástica. Nem de balada ou só festa. Simplesmente deixarei que o vento e os bons augúrios me levem aonde for, procurarei deixar o espírito aberto para experimentar a liberdade de poder ser o que se é, reiventando-se, renovando-se e conhecendo-se. Se o plano do dia for subir uma montanha, subamos. Se for jogar baralho com ucranianos, joguemos. Se for passar frio numa rodoviária perdida no mundo, passemos. Que seja o que tiver que ser. "As coisas por si só decidem se continuam no prosseguir!", anunciaria Guimarães Rosa.


O mundo é feito de lugares e pessoas, e é isso que quero conhecer.

E assim já começaram as despedidas...




Um comentário:

Karen disse...

Meu caro,

não digo que estou surpresa, já sabia dos planos de vocês, mas o tempo passou muito mais rápido do que eu presumia.

Vou com vocês na mente, pode ter certeza. Prometo consultar seu blog em busca de notícias sempre que possível. Quem sabe, dependendo de para onde o vento soprar, eu acabo até encontrando vocês em algum lugar do mundo? Afinal, não sou de fazer muitos planos, mas acho que isso acaba sendo até bom.

Precisando de algo no meio do caminho, entra em contato ... nessas mochiladas pelo mundo conheci muita gente boa em muitos locais que sempre podem dar uma mão.

Grande abraço e toda a sorte do mundo. Inveja boa não mata, e vou me permitir saborear um pouco dela agora!!