quarta-feira, 25 de junho de 2008

Imigração

Numa prova de que um corpo pode estar em dois lugares ao mesmo tempo...

Bons Ares no Wordpress.

A mesinha do café

Toda vez que, no trabalho, levanto da minha mesa e vou até a mesinha do café e do chá, acabo dando uma olhada para fora pela janela. Vejo os bosques incrustados no meio dos bairros do Mossunguê, Barigui e Santo Inácio, avisto algumas casas perdidas, um ou outro pedestre caminhando. Na BR277, sempre movimentada, vejo carros indo e vindo. Indo e vindo.

Servindo-me um pouco de chá ou café, vai me dando uma vontade de ir e vir, assim como os carros. Melhor dizendo, de pegar o carro e ir para qualquer lugar e não vir mais tão cedo. É a vontade interminável de viajar, de pôr o pé no mundo. É o famoso bicho carpinteiro. É, em francês, o que costumam dizer le virus de la bougeotte. É aquela vontade de sentir o vento no cabelo, de sentar em uma parada de ônibus qualquer, no meio do nada, que por vezes é conhecido pela alcunha de mundo, onde nem Judas teve coragem de bater as botas, e deixar fluir a conversa com quem quer que seja: homem, mulher, idoso, criança ou cachorro (os vira-latas sempre são parceiros de espera em pontos longínquos).

Não havendo ninguém, fica-se tão-só a pensar.

É, ainda, aquela gana de se ver em um lugar tão desconhecido que não se sabe dizer se a “civilização” está para o norte ou para o sul. Um desejo de ficar ouvindo sotaques, dialetos e línguas diferentes, percebendo os trejeitos, vendo quais são as preocupações mundanas alheias – nessas horas, a única preocupação que se tem é seguir em frente, esperando que nenhuma preocupação mundana o acometa tão cedo. É ficar observando as pessoas e pensar que você não faz parte daquele lugar, mas que tampouco faz parte de lugar algum (viajar te transforma em placeless e worldful). É respirar aquela liberdade, única, que se sente ao estar em lugar completamente desconhecido. Criar raízes te dá estabilidade e faz você se determinar com base no outro (pessoas e coisas). Viajar faz você se determinar pela ausência e, por conseguinte, por você mesmo.

Nisso tudo penso antes de voltar à minha mesa. Dela, não vejo outra coisa que cabeças olhando para computadores ligados e à procura de um ponto final colocado no lugar errado.

Agora, como é que vou explicar tudo isso quando me perguntam por que tomo tanto chá?


Obs.: senhores e senhoras, preciso dizer que ando com problemas com internet, de forma que não tenho podido acessar o blog. Isso não quer dizer, no entanto, que ele esteja parado, coisa que o status dá a entender... Mais histórias virão, asseguro. Há umas duas já no prelo.

quinta-feira, 29 de maio de 2008

Carrocinha

A minha “não tão querida porém já apreciada” carrocinha foi-se embora. Ela não era linda, não era possante, não era nada de especial, mas era a minha carrocinha. Mais: além de minha, era única. De tão anciã, já tinha virado “highlandra” a bichinha.

Embora temperamental e difícil de lidar, a carrocinha possuía o seu charme. Mais que muita gente metida por aí (cada um sabe o nariz que tem). Não há o que negar: nos demos bem. Foi um bom mês e meio, quase dois, de convivência quase pacífica (nesse “quase” está implícito um ter querido espancá-la, destruí-la e jogá-la pela janela quando ela teimava em não me respeitar). Às vezes, se estava boazinha, ia que ia linda, faceira, cheia de ternura aonde quer que fosse. Fazia o que eu mandava, na ordem que eu queria. Tudo como manda o figurino.

Outras vezes, quando tinha começado o dia com o pé esquerdo (independente do dia, sempre levava de 10 a 15 minutos para pegar no tranco), a bicha se negava a absolutamente tudo. Não havia santo que a fizesse se mover ou sair de sua teimosia. Nessas horas, não me restava outra coisa que reclamar, praguejar e esperar a sua boa vontade.

No entanto, de tanto eu me queixar, a carrocinha foi substituída e enviada dessa para uma melhor. Espero eu que para o paraíso das carrocinhas. Agora, pois, estou turbinado: new carrocinha 2ª versão plus dasarábias! Mas a 1ª ainda mora no meu coração...

Descrição física da carrocinha antiga:

50cm de altura por 60cm de “fundura”;

2kg e lá vai fumaça;

cor de parede bege suja;

suja;

Pentium I!;

Windows 2000!;

e, o mais importante, fantásticos 256MB de RAM!!!

Digam lá se a carrocinha não era uma belezura de caixinha de computar?! Por mais que não conseguisse abrir internet e pedeéfes ao mesmo tempo, a calculadora e o Paint iam juntinhos supimpa sem travar. Bobeando, dava até para jogar paciência.

Ô não-saudade da minha carrocinha!


Obs.: de tanto eu chamar o meu ex-computador do trabalho de “carrocinha”, ela acabou até ficando conhecida por; o funcionário do setor da informática, quando chegou para trocá-la, disse: “É hoje o dia da carrocinha!”


sábado, 24 de maio de 2008

Paula Gomes esquina com Duque de Caxias

Este tem sido o meu endereço no último mês e pouco. Faz parte das mudanças dos últimos tempos. Da janela não vejo mais o varal do prédio, mas sim outras coisas, muitas outras coisas...

Além da Telabrix, empresa de "Molduras, teclas, poster's e espelhos" (escrito exatamente como está na placa) e dos dois pinheiros ao fundo, outras coisas acontecem na esquina da Paula Gomes com a Duque de Caxias.

Era uma vez, pois, um torto... Bar-boteco-balada que anima e desanima os desavisados. Anima porque provém aquela santa cervejinha do final do dia com um bolinho de carne pelo qual muito apreço tenho. Une os amigos, os não-amigos, os inimigos e os desconhecidos. A partir da quarta-feira, a quadra, especialmente os 30 metros da porta de casa até a esquina, vira cenário de baladinha. Com direito a tudo. Reúnem-se todos os tipos de pessoas: bêbados (os que mais comparecem), tiozões (los viejos verdes, que não deixam de fazer parte da categoria "bêbados"), trabalhadores em geral (todo e qualquer tipo de profissional), os módis, os emos, os poetas de balcão e os não de balcão, os roqueiros, os flevers, a galera do tubão, e a nova geração de wonkeiros, que vem fazer o esquenta no boteco da esquina antes de bater cartão ali na fábrica de chocolates (salve, salve Gene Wilder!).

Por outro lado, desanima porque, e isso só vê quem mora aqui na quadra e sai de manhã cedo, existe um depois de toda essa agitação noturna: bêbados jogados pela rua dormindo, garrafas de cerveja quebradas, um sem-fim de bitucas de cigarro, pedaços de comida, lixo em geral, vômito, roupas esquecidas. O cenário matinal é de um fim de batalha, onde até o espólio ignorado já foi levado.

Mas tudo isso, se "apreciado com moderação", deixa a quadra com um ar jovial, um ar portenho notívago bem-vindo. Aqui na Paula Gomes, voltando para casa de noite, chego a me sentir em Buenos Aires. Aquele povo pela rua conversando, rindo, vivendo a rua como um espaço seu, coisa que no Brasil poucas vezes vi. A Paula Gomes com Duque de Caxias, para mim, é quase como uma miniatura da minha tão querida Caballito. Ai minha Caballito! Aliás, quarta-feira conheci por acaso um ex-morador de Caballito perdido aqui em Curitiba.

Também há as figuras carimbadas da quadra: o varredor de rua que sempre me cumprimenta, as putas do puterinho da região que nunca vi mas sei que estão lá; os tiozões do estacionamento da quadra, que passam o dia jogando baralho; os outros da mercearia portuguesa, que passam a vida a tomar cerveja e cultivar a pança; a moça do lado de casa, que mora debaixo da igrejinha e vive brincando com a filhinha na calçada; e os dois moradores de rua que moram na esquina da Duque com a Paula (um em uma esquina, outro na outra).

A Paula com a Duque é, pois, a minha Vallese con Acoyte atual.



sábado, 17 de maio de 2008

11h12

Fico me perguntando em que consiste uma aventura. Preciso ir a lugares distantes e exóticos para dizer que tive uma aventura? Preciso viver um grande amor? Preciso ter feito algo de extraordinário e único? Seria necessário tudo isso junto, uma dessas coisas ou nenhuma delas?

A teoria da literatura, falando bem superficialmente e como aquele que matou aula muitas vezes, diz que são necessárias algumas coisas para haver ficção: ação, cenário, personagens e um narrador. Na ação, que se leia conflitos, problemas e afins. Em cenário, que se leia um lugar, seja qual for. Nos personagens, que não se leia nada. "Personagem" já diz tudo, porra. Em narrador, que se leia alguém que conte a história, seja um narrador onisciente em terceira pessoa ou um personagem em primeira.

Tendo em visto esses fatores, apresento aos senhores:

Ação: movimentos sísmicos da minha crescente barriguinha.
Cenário: meu trampo às 11h12.
Personagem: minha barriga, chamada doravante de Pança, e cheiro de comida de mãe, chamado doravante de Cheirinho.
Narrador: este que vos fala.

Vamos, então, ao que viemos.

Era uma vez Pança sentada em sua cadeira de trabalho, às 11h12. Já vinha cumprindo expediente vazia desde 8h. Às 10h12, deu uma roncada, levantou-se, roubou bolacha do vizinho e se acalmou novamente.

Até que, às 11h12, teve início o seu sofrimento. Do edifício vizinho, do apartamento que dá justamente na janela da sala onde trabalha Pança, Cheirinho começou a se fazer sentir. Num primeiro momento não era completamente distinguível, mas foi sendo-o aos poucos: um feijãozinho com paio, arroz branco, franguinho feito na chapa com salsinha e alecrim... Hum... perdição.

Pança, sem saber muito bem o que fazer, tentou se controlar. Em vão. Cheirinho, aparentemente notando essa estratégia de defesa de Pança, intensificou-se. Pança simplesmente foi ao delírio. Começou a se debater quase que ferozmente. A gula tinha-lhe descido pela garganta e o dominava quase por completo. O que fazer? Pança, acreditador do autocontrole e do poder da mente, que não tem, quis impor sua não-vontade de se devorar e tentou resistir aos feitiços de Cheirinho.

Todavia, acabou sucumbindo. Os 48 minutos que antecederam a saída de Pança do trabalho foram quase intermináveis e seu ataque ao buffet mais próximo digno de nota dos melhores comentadores da História.

Ainda bem que o VR diário de Pança é de R$10,00.

Obs.: apesar de tudo indicar o contrário, a balança da farmácia da esquina me disse isso ontem que continuo sendo o felicíssimo possuidor dos meus 69 quilinhos, pesados inclusive depois de um fatídico almoço livre no Sorella (bucho cheiíssimo) e com roupa!



segunda-feira, 12 de maio de 2008

Preenchendo o espaço em branco

Há tempos Bons Ares não sabe exatamente o que dizer. Pensa, pensa, mas acaba se coçando. Por vezes Bons Ares é tomado de uma coragem danada, só que acaba culminando em bocejos, dor nas costas e nenhum texto escrito. O máximo que Bons Ares anda fazendo é sentar-se na frente do computador, entrar na página em branco do blog e não conseguir escrever nada. Uns pensam que Bons Ares está em crise. Outros afirmam que é tão-somente aquele vento encanado que espanta as boas idéias. É por isso que Bons Ares resolveu simplesmente sentar e escrever. O que viesse!

A vida vai indo, digamos assim. Com algumas mudanças. Mudança de país, mudança de status, mudança de casa, mudança de trabalho... O bom e velho Little Horse ficou para trás e deu lugar ao São Francisco, atual residência de Bons Ares (deveria, então, este blog se chamar Saint Francis ou Muito Pinhão?). Não seria uma má idéia. No entanto, optamos por não mudar nada. Em time que está ganhando não se mexe, mesmo que ele não esteja ganhando.

Bons Ares tem seus leitores. Não se sabe se são poucos ou não. Um post já foi publicado sobre isso. Alguns, sempre presentes, continuam deixando sua marca e mijando no "post" de Bons Ares. Outros entram, lêem e vão embora sem deixar rastro. Estariam de fato lendo? No final das contas, não é disso que se trata!

De qualquer forma, Bons Ares está aí. Um dia após o outro em busca de bravatas e presepadas. Elas estão se tornando cada vez mais rebuscadas. De uma bagaceira se tornaram encontro de queijos e vinhos com direito a truco sujo, demonstrações de ciúmes, cabras vomitando e gente voltando para casa trupicando. Nada que corações mais fortes não possam suportar.

Ao mesmo tempo, Bons Ares está fazendo planos. Não sabe ainda quais, mas está fazendo. O tempo dirá.

Fato é que os antagonistas de Bons Ares estão em falta. Onde estarão Pato-Perro, os morcegos voadores e os outros tantos inimigos que bravamente enfrentamos sem perder uma gota de sangue? Dizem que morcego não tem vez no São Francisco. Coisa do vampiro do Trevisan. Vai saber.

Diversões: Bons Ares tem tomado vinho, escrevinhado e comido cachorro-quente, o que tem contribuído para a não-forma deste que vos fala.

Que dizer disso tudo? Pois não sei... Digam os senhores.






segunda-feira, 28 de abril de 2008

O contraditório mundo capitalista

Este mundo que nos rodeia, dito e sabido capitalista, é, a meu ver, por demais contraditório. Agora que sou um menino pagador de impostos, batedor de ponto às 8h e funcionário com direito ao plano mais simples da Unimed, que me cobre com cama comum em enfermaria em casos de acidentes de trabalho (só não sei com que é que vou me acidentar revisando textos; só mesmo se meter a caneta vermelha sem querer no olho!), estou me deparando, novamente, com as contradições da vida de quem acha que trabalhar leva a algum lugar. Vamos, pois, a uma explanação mais vagarosa do assunto.

Eu, muito solícito (acordar para ir trabalhar é o maior ato de solicitude que um ser humano pode fazer), me levanto às 7h, tomo o meu banho quente, me visto já para sair para o trabalho e vou à cozinha preparar algo de comer. Desjejuo, côo um cafezinho, às vezes tomo um suco, arrumo a minha mochila e parto rumo ao inevitável. Por sorte, não padecendo de mais este insolúvel problema do mundo moderno, posso sair de casa às 7h45 e chegar no trabalho às 7h58, a tempo ainda de bater o cartão antes do horário (ponto para mim!). Me sento na minha cadeira, ligo a carroça que insisto em chamar de computador, abro o Dicionário Houaiss, checo meus e-mails laburais, pego a print que estava fazendo no dia anterior e começo mais um dia de trabalho.

Às 11h48, horário já consolidado pelos outros revisores, saio para almoçar. Como bem (meu VR é de R$10,00 e eu o aproveito ao máximo; às vezes até ultrapasso). Às 13h estou de volta, bato o meu cartão e continuo, já meio cansado, já meio com a barriga cheia, já meio com lezeira do almoço, a labuta.

Às 16h20, começo a recolher meus artefatos mágicos de trabalho, a arrumar minha mesa, a fechar a planilha que controla o meu rendimento diário e desligo a carroça (ops, digo computador!). Bato, então, feliz da vida, meu cartão às 16h24 e só vou lembrar do trabalho no dia seguinte, às 7h, quando o maldito do meu despertador vem com aquele pim-pim-pim infernal.

Mas não jaz aí a contradição capitalista que quero abordar. Não contando, é claro, que trabalhar por si só já é uma contradição. Como diria um grande amigo meu, Piper Barrigudinho Zorek, "se trabalhar fosse bom, ninguém te pagava para fazer". A contradição jaz no fato de que a organização do mundo capitalista, e é assim para a grande maioria dos casos, faz com que os funcionários do mundo afora trabalhem das 8h às 18h.

Pensemos: se todos têm que trabalhar das 8h às 18h e as lojas, em geral, tirando as dos shoppings, que são por natureza insuportáveis, fecham às 18h porque os seus funcionários também seguem à risca o sistema das 8h às 18h, como é que as pessoas que trabalham podem resolver suas pendências, comprar suas coisas e consumir tudo o que o capitalista quer que elas consumam? Pensemos ainda mais: se querem que gastemos, por que a maioria das coisas só fica aberta na hora de expediente normal, justamente quando estão todos trabalhando, ao invés de abrir em horários distintos para aquele que trabalha durante o dia todo poder ir resolver tudo o que tem que resolver em paz? Continuemos pensando: como o mundo capitalista, já dito e sabido contraditório, não é organizado de uma maneira inteligente, acontece que todo mundo que trabalha, tendo que resolver seus problemas burocráticos desnecessários do mundo, acorrem aos xópins, que superlotam depois do expediente, fazendo com que todas as lojas encham, que haja filas por todos os lados e que as pessoas, por motivos óbvios, ou não sejam atendidas ou o sejam muito mal, o que, no dia seguinte, vai refletir certamente na qualidade e eficiência de seu trabalho na "repartição". Trabalhando menos e pior, têm menos chance de ganhar uma promoção e assim ganhar mais para gastar mais. Tudo, a meu ver, trocado. "Barbina do Oeste" é o que tenho a dizer.

Eu, por sorte, tenho um horário diferenciado e mais humano e saio às 16h24, o que me dá 1h30 para resolver todas as pendências burocráticas chatas existentes e ainda não existentes. À exceção, é claro, da mais chata do mundo: ir ao banco. Outra contradição, não? Os bancos, que são os lugares e empresas que tratam exatamente do instrumento pelo qual todos podem gastar, são os que abrem mais tarde, fecham mais cedo e que te atendem pior por telefone, fazendo sempre que você tenha que ir de extremo mal-humor (e depois os atendentes ficam se queixando que as pessoas nunca estão felizes nos bancos), na sua 1h de almoço, ao maldito e desolador banco resolver uma idiotice de R$20 ou R$30,00 que deveria, por bom-senso e eficiência mínima, ter sido solucionada por telefone em 2 minutos. Contraditoríssimo!

Por fim, a última discrepância racional e sistêmica do nosso tão querido capitalismo é o fato de haver um abismo entre o preço das coisas e o que as pessoas ganham. Te pedem preços exorbitantes por coisas ínfimas, como se todos ganhassem os R$5.000,00 mensais que todo bom capitalista moderno quer que ganhemos, dos quais R$4.000 têm que ser consumidos em contas e compras. Isso sem pensar que tudo o que economizamos acaba sendo, em algum momento, gasto com alguma coisa (viagens, imóvel, automóvel, eletrodomésticos, roupas, etc.). Ou seja, num bom português, tâmo tudo chafurdando na merda!

O que fazer então frente a tudo isso? A resposta, meus caros, é comer em 30 minutos e correr no banco antes que haja fila!

E depois dizem que este mundo não é cheio de doido!




sexta-feira, 11 de abril de 2008

Se liga, rapá, que se não pagar vai levar pipoco na cara!

Pois foi com esta frase do título, tão simpática, tão gentil, que nossa história começou. Malandragem, tiozão de uns 39, 40 anos, barrigudo, cara inchada de boteco e jeitão de patranheiro de puteiro, me fechou, saiu do carro (um Mégane modelo antigo) e veio me dando de dedo. Ao mesmo tempo, foi se metendo janela adentro para pegar a chave do meu carro, que estava na ignição.

Eu, que já estava com o cu na mão pela atitude do tiozão, afastei sua pata gorda e sebenta e não deixei que ele pegasse a chave da minha querida viatura. Até aí, eu não estava entendendo nada do que estava acontecendo, assim como, caro leitor, vossa senhoria não está entendendo nada até agora deste texto.

Malandragem só foi dizendo: "Se liga, rapá, que tô ligado no que cê fez. Se não se resolver agora comigo vou chamar uns conhecidos que vão resolver a treta por nós!" Ainda não entendendo nada, respondi que não sabia do que ele estava falando, que ele devia ter se confundido. Malandragem continuou falando a torto e a direito, de forma que fui, aos poucos, capiscando que ele achava que eu tinha quebrado o retrovisor dele, que de fato estava quebrado. Já fui respondendo: "Quebrei nada não, senhor. O senhor está se confundindo." Foi aí que ele começou a dizer que eu estava me entregando ao dizer isso e que tinha um revólver dentro do carro, revólver o qual ia resolver toda aquele pendenga.

Eu, que tinha mais três amigos dentro do carro, soltei: "Cara, se liga, meu. Eu tenho três testemunhas dentro do carro que podem confirmar que não fiz nada!" Fora, não disse isso a ele, outro amigo, de moto, que devia estar chegando. Caso ele viesse para cima de mim e me pegasse, sei que tinha quatro escudeiros para me ajudar.

Mas foi neste exato momento que algo inacreditável, ainda mais neste país, aconteceu. Nós, que estávamos em uma rua sem nenhum movimento, onde ninguém jamais escutaria nada, vimos uma viatura da polícia, santa polícia!, santa polícia!, virando e parando o carro atrás de nós. Prontamente, sabendo que aquele que se prontifica e se apresenta tende a ser tomado como inocente, o que de fato eu era, saí do carro e fui tranqüilamente falar com a policial que estava na boléia. Pedi a ela que abaixasse o vidro e lhe expliquei a situação: "Malandragem nos abordou, nos fechou, saiu do carro nos ameaçando e nos acusando de ter quebrado o retrovisor do seu carro. Ainda disse que tinha uma arma no carro ou com ele."

Os dois policiais saíram da viatura e escutaram a versão do Malandragem. Acabaram escutando também a versão dos meus fiéis escudeiros, a qual, coincidência?, era a mesma que a minha. Notaram, no entanto, que Malandragem não era das pessoas mais sóbrias, o que contou como pontos a menos para ele. Deram uma averigüada no meu carro, para ver se de fato tínhamos batido nele ou não (detalhe, como o meu carro é branco, se eu bater, encostar ou relar em alguém vai ficar com certeza a marca da tinta e do raspão), perceberam que estávamos falando a verdade e foram falar com o Malandragem, que, a essa altura do campeonato, já estava começando a ficar com sérios problemas. Os pêlos do cu dele devem ter dado aquela arrepiadinha...

A policial então me perguntou se eu queria ir à delegacia dar queixa por ameaça verbal, respondi que não, para não perder a minha tarde nisso, e pediu que fôssemos embora logo. Enquanto dava a ré, só vi o Malandragem e os policiais indo em direção ao carro dele para fazer uma inspeção. O menos que ia acontecer era o Malandragem ter que se explicar, do ocorrido e do seu bafo um tanto quanto alcoólico...

Nós, é claro, demos no pé. Que o pipoco ficasse pro Malandragem!




segunda-feira, 7 de abril de 2008

Um bando de criançolas que gostam de vidjiguêimi

Todos os homens têm, dentro de si, um menino à espreita. Aquele que eu tenho dentro de mim gosta de jogar videogame (ou, num mal português, telejogo!). Sorte minha ou não, este tal moleque que sou eu acabou achando outros três, tão meninos ou mais piás que eu, e se juntou para fazer uma longa sessão de jogatinas. Ingredientes que não podiam faltar? Pizza, refrigerante e muita rivalidade.

Pois foi assim boa parte do fim de semana: dedicado ao vício. Começamos na sexta à noite. De la Croix, que certamente está lendo este testículo, acompanhou-me no encontro com os companheiros navegantinos. Chegamos, botamos o papo em dia, fofocamos um pouco, mas, ao final, nos dissemos: "O dever nos chama, caros. Vamos ao que viemos!" Levantamos e começamos uma longa noite de muito videogame.

O jogo? Winning Eleven. As escolhas de cada um? Quando com times, era Camilo com o Chelsea, Piper com o Manchester United, Julio com o Real Madrid e eu com o Barcelona. Quando com seleções, Camilo variando mas ficando no geral com a Itália, Piper com a Inglaterra, Julio com o Brasil (viadinho!) e eu com a França (minha eterna sina).

A primeira copinha já começou com um clássico de grandes: Piper (Manchester) x Julio (Real Madrid). Depois de muitos berros, nervosismos, intimações e demonstrações de macheza, empataram em 0 a 0. O jogo seguinte foi eu contra Camilo. Apesar do nível mais baixo, também houve um clima de acirramento ferrenho. Resultado também em 0 a 0. O terceiro jogo da noite foi eu contra o Piper. Comecei fazendo dois golaços antes da metade do primeiro tempo. Alegre e entusiasmado, pensei: "Bah, será que tenho chance?" Mas Deus não quis estar do meu lado e o fiadamãe do Piper virou o jogo, humilhando-me. Desacreditado, tive que continuar vendo os outros jogos à espera do meu próximo confronto.

A partir dos jogos seguintes, só foi se fazendo ver o óbvio ululante. Julio e Piper, quando jogavam contra eu ou o Camilo, nos humilhavam, ao passo que os dois últimos íamos tentando não perder de goleada. O interessante para nós era jogarmos um contra o outro. Era mais feio, mas pelo menos mais passível de competição. Por outro lado, quando os dois profissionais jogavam acabava sendo mais divertido. Primeiro porque a qualidade do jogo, das técnicas aplicadas e das jogadas era muito superior. Segundo porque a zenzice do Piper se contrapunha tanto ao nervosismo e irritadice do Julio que chegava a ser hilário como este se levantava para reclamar, como xingava quando errava um chute, como esperneava quando levava um gol e como ficava "bravinho" ao perder. Tanto foi que antes mesmo de terminarmos nossa segunda copinha já tinha ido dormir. Por brabeza, é óbvio.

Camilo, Piper e eu ainda continuamos, como nos velhos tempos, jogando madrugada adentro. Com os joysticks na mão, vimos o dia amanhecer contentes da vida de termos rememorado nossa infância e adolescência.

No dia seguinte, o Piper tinha que ir para Floripa encontrar a namorada. No entanto, o vício e o saudosismo foram tão fortes que tivemos que jogar um pouco mais. Julio tinha ido no ensaio da banda e não se juntou a nós.

De tarde, com Piper já longe, só deu eu e o Camilo praticando um pouco. Perder tanto de goleada ficou feio para nós. Mais à tarde, porque também somos filhos de Deus e jogar videogame enche o saco, fomos pegar uma prainha. Vidinha mansa na Praia Brava, cervejinha no copo, conversa com os amigos... Tudo como manda o figurão lá de cima.

À noite, fui jantar sushi com outros amigos. Restaurantezinho íntimo de frente para a praia, sakerinha de jaboticaba, conversa da boa... Não podia estar melhor. Camilo e Julio acabaram pegando uma baladinha "de leves".

Domingão de manhã, eu, que tinha concurso, acordei cedo, tomei um café e rumei para a Univali. Surpresa minha foi encontrar centenas de centenas de pessoas lá se amontoando para encontrar suas salas. "Jesusmariajosé", pensei. Fiz, pois, feliz minha prova. Apesar de não saber algumas questões regionalistas (do tipo "Qual é a data da emancipação de Itajaí?", "Como é o nome do atual prédio do Museu Histórico de Itajaí?", "Cite dois afluentes do Itajaí-açu."), a prova estava fácil. A parte de português e informática era patética. No entanto, acho que reprovo nesses pequenos deslizes cometidos nas perguntas regionalistas.

Finalzinho da manhã, volto para Navegantes, depois de um pequeno congestionamento antes justamente da ponte sobre o rio Itajaí-açu, e vou encontrar o Camilão, que estava na praia tirando uma soneca e tomando uma cor, além, é claro, de uma vaca. Ele foi pego de surpresa por uma onda que o molhou inteiro! Hahahaha!

Na volta, comemos algo e nos viciamos mais um pouquinho no vidjiguêimi. Quando teremos outra oportunidade como aquela? Talvez por desígnio divino, encarei novamente a minha sina, a França de Henry, Trézéguet e Barthez, e acabei me encontrando tanto com o time que acabei jogando à altura do Camilo, dando-lhe muito trabalho e preocupações (leia-se gols do maldito Henry).

Finarzinho da tarde, já com os dedos cansados de ficar apertando botão e com os ombros tensos, entramos no carro e voltamos. Com pensamentos maléficos, confessamos...



domingo, 30 de março de 2008

O tal do "Jacó"

Observação preliminar: esta é uma historieta para curitibocas ou conhecedores dos bares da cidade.

Sexta à noite saí. Fui acompanhar uma amiga, de fora, que queria conhecer o tal do "Jacó" (como não quero citar nomes para depois não ser apedrejado em praça pública, traduzi o nome do bar para o nosso bom e velho português; aquele que não souber do que Jacó é tradução, leia o texto que, com os indícios e descrições, descobrirá; se mesmo assim não se der conta, fuce que acha; por fim, se nem com tudo isso descobrir, porra, faça o favor de enfiar a cabeça na privada e puxar a descarga). Ela queria porque queria ir no Jacó. Tinham aconselhado para ela, que a baladinha era boa, blá, blá, blá. Eu acabei indo para acompanhá-la. Antes, porém, fui a um churrasco do trabalho (carne e muita, mas muita bebida - uísque, amarula, bacardi, vodka, etc. - de graça), de forma que cheguei lá vindo de um ambiente alegre e de muito truco.

Quando cheguei diante do dito estabelecimento, que fica quase na esquina, ao lado de um posto de gasolina, vi que havia uma fila considerável na frente. Umas trinta pessoas, pelo menos. Pensei: "Puta merda!" Mas vamos lá, que combinado é dívida para mim. Muito embora estivesse animado pelas conversas do churrasco, não quis conversar com ninguém na fila. Por quê? Bom, para aqueles que conhecem o Jacó, as pessoas que freqüentam lá são as mais "caras e bocas", as mais blasées, as mais cheira-puns que possam existir nesta cidade já infestada de gente doida que não apanhou quando guiança. Se tivessem apanhado, aposto que não fariam "aquelas" caras quando cheirassem pum.

De qualquer forma, entrei na fila e ali fiquei até chegar a minha vez. Ao entrar, tive que passar por aquela situação desagradável de ter que ficar provando quem você é e quantos anos você tem. Puta que os pariu: eu, com barba na cara desde os quinze, ter que ficar mostrando RGzinho para entrar em baladinha de freak é o fim! Mas vamos lá, pensei eu. "Maikon, de maior, 26 anos", disse o porteiro. "Sim, sou eu", disse eu com cara de cu.

E entrei...

E me choquei!

Carambola, que aquilo parecia um circo de horrores, cheio de gente estranha, com hábitos esquisitos. O que vi? Bom, descrevamos: de um lado do corredorzinho de entrada, um bando de piá de bosta encostado, com um pé na parede e cara de tacho, olhando com aquele olhar de "I'm foda!". Do outro, um grupete de periguetes olhando para mim e dando a entender que "Eu sou foda, sou moderna, sou gostosa e não vou dar para você!". "E quem disse que eu quero te comer, sua louca varrida?", pensei eu. Subi o primeiro degrau, o segundo e o terceiro. Se não me engano, são três. Na curvinha para entrar no bar, à esquerda, o vislumbre que o corredor tinha me proporcionado multiplicou-se infindavelmente. Havia, dentro daquele ambiente pequeno, que já foi um bar de gente meio modernosa mas do bem, um mar de freaks com seus penteados incompreensíveis, sua exacerbação de tatuagens (braços, ombros, peitos, orelhas, nariz, pescoço e vai lá saber mais onde), suas atitudes extravagantes com tom nítido de "Estamos pouco nos fodendo com você mas mesmo assim queremos a sua aceitação". Aceitação o caralho, o meu nome é Zé Pequeno, porra!

Mais um passo e levo uma vaquinha do mar de freaks. Levado pela onda de "Muito louco, muito louco", acabo chegando até a pista de dança, onde o eletrorock, estilinho do momento, imperava. Até aí nenhum problema (há bastante coisa boa nesse estilo), não fosse por todas as músicas serem iguais e o som estar tão alto que não se podia nem ouvir os próprios pensamentos, imagine então conversar com alguém. Não tivesse encontrado a minha amiga perdida lá no meio, teria ido buscar o meu protetor de ouvido (que consegui com o meu pai, pois fica o dia inteiro ouvindo aquela perfuratriz zoando a cabeça). Oi, oi, e aí, e aí, tudo bem, tudo bem, e aí, e aí... Bom, não foi possível conversa porque não se podia realmente ouvir nada. Ficamos um pouco na pista, ela dançando, eu olhando para os lados e contemplando a freakaiada, mas uma hora o fato de estarmos lá para conversar e não podermos foi mais forte e resolvemos ir para o balcão, que é lugar de gente conversadeira que nem eu.

Balcão, querido balcão, pensei eu ao apoiar o meu cotovelo nele e pedir uma caipirinha de bódega. E aí pudemos finalmente conversar.

No entanto, já umas duas horas de conversê tête à tête, o sonzinho, que havia se transformado em eletro-rock-bate-estaca-do-djanho, já estava penetrando a minha alma, que, pobrezinha, pedia clemência. O empurra-empurra já se fazia sentir há horas, tanto que nós, encostados no balcão conversando mui calmamente, não conseguíamos ficar um minuto sequer sem levar cutuco dos doidos. Era um tal de se empurrarem, se abraçarem, dançarem, se jogarem no chão, se beijarem todos de uma só vez (a nova modinha do momento, conhecido também por grupal kiss), se esfregarem num, depois noutro (nada contra, por favor; acho mesmo que têm que fazer o que quiserem; eu mesmo gosto de uma amassação, mas não levando cutuco no rim, né?). A coisa chegou a tal ponto que tivemos que ir embora, porque não havia Cristo, nem Judas, que suportasse ficar lá.

Indo embora, depois de pagar (a melhor parte, porque, ao contrário do que pensava, só paguei cincão para entrar, mais, é claro, as caipirinhas e águas que pedi), só íamos vendo as pessoas com aquelas caras de "I'm fuckin' foda, and you?"

Na minha cabeça, pensei: "I'm old mesmo, só isso!". E um abraço para a freakaiada. Que se matem naquela joça.

E fui feliz da vida!



quinta-feira, 27 de março de 2008

Indicação da TV5

Só para constar nos autos, já que me deixou contente, fiquei sabendo hoje que Histoires de voyageurs foi indicado pela TV5 como um dos melhores blogs francófonos de viagem. O link para quem quiser ir lá conferir é: Blogosphère de TV5.

Para quem não sabe, participo desse blog, inteiramente em francês, com um bando de franceses loucos, todos viajantes professionais que já percorreram o mundo todo. Lá, eu sou o madelgado. Trata-se de um blog onde contamos histórias, anedotas e outras coisas afins a viagens. Entrem lá. É de ficar com o queixo caído das histórias que eles têm para contar.

Beijo nas crianças.


terça-feira, 25 de março de 2008

Ufff... nada de novo na terra do sempre igual

Bons Ares está mais parado que bêbado olhando para o meio-feio e esperando que ele responda. Na verdade, é uma mistura de misturas coisas: preguiça, falta de assunto, correria, preguiça e um pouco mais de preguiça. Mas isso não quer dizer que não pense, todo dia, que tenho que escrever, que tenho que brindar vossas pessoas com minhas pérolas observísticas do mundo. A de hoje não é nenhuma. Sentei mesmo só para escrever, porque já fazia um mês que não postava nada, e não quero ser tomado por vadio, cargo que o Camilo e o Bíver já muito bem o merecem.

Sendo assim, nada de muito novo na terra do sempre igual. Vidinha curitiboca de sempre. Ainda revendo os amigos (parece, felizmente, que essa fase não termina nunca), saindo de vez em quando (com exceção desse fim de semana, que foi radicalmente vertical por conta da visita do Greg, amigo do Histoires des voyageurs), ouvindo minhas músicas e lendo meus livros. Novidades? Poucas: a melhor delas, que não quer dizer que seja muito boa, é que consegui um emprego e estou lá eu gastando oito horas do meu dia em troca de uns tostões no final do mês. Esperemos que não seja para o resto da vida... Planos sendo feitos na cabeçola aqui. No mais, meio que me mudei e desmudei umas duas vezes no último mês...

Bom, fico por aqui porque não tenho muito mais a dizer. Tendo idéias na cabeça, e espero que tenha logo, brindar-vos-ei com elas.



segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Coisas que a gente faz na intimidade do banheiro

"Sim, Salabim, traz uma saboneteira para mim!", desejo eu desesperado.

"Uma saboneteira?", pensa Salabim em dúvida.

"Yep, sir.", respondo eu olhando para a cara de dúvida de Salabim. "Tudo o que eu quero é uma simplória saboneteira."

"Mas, meu caro, por que cargas d'água você quer uma saboneteira? Você pode pedir o que quiser e pede uma saboneteira?", pergunta Salabim muito intrigado com o meu pedido.

"Pois eu vou lhe responder, vossa magiência senhor Salabim.", digo eu. "A questão é que não suporto mais tomar banho neste banheiro do djanho e não ter onde pôr o meu sabonete."

"Como? Explique-me melhor tudo isso.", disse Salabim com um tom psicanalítico.

"O fato é que, durante este carnaval do bom Dionísio, o qual estou passando aqui no festival P*, reduto de todos os loucos psicodélicos uivantes deste planeta sem dono, estou tendo de tomar banho nestes banheiros do cão, onde só tem água quente de noite, onde ou tenho que fazer uma hora de fila para tomar banho em horário de bom cristão ou sou obrigado a tomar banho às 4h da madruga, onde não posso nem olhar para o piso porque corro o risco de encontrar de tudo neste mundo, inclusive camisinha já usada cheia de porra, o que de fato já aconteceu, onde tenho que suportar uma série de outras provações para fazer valer a querida saboneteira que tenho em casa, assim como o box, a toalha seca pendurada no suporte e outros pequeninos utensílios do banheiro.

"Hum...", muge Salabim.

"Hum... nada, meu caro. É dose mesmo... Fosse o senhor, vossa magiência Salabim, no meu lugar, não sei o que seria."

"Mas é tão sério assim a situação toda?", pergunta Salabim.

"Se é, caríssimo!", respondo eu. "Isso que nem elenquei para o senhor todas as outras barbaridas pelas quais eu e muitos outros temos que passar: cidadão que chega, abre o porta-mala do seu carro e põe Janis Joplin no talo às 4h da manhã; cidadão que começa a berrar do lado da sua barraca empolgado pelo fato de o outro cidadão ter posto Janis; cidadão que passa correndo e incita todos os outros loucos a cantarem Janis com ele; cidadão que, às 6h15 da manhã, esperançoso de se comunicar, começa a uivar e fica esperando, do alto da colina, que todos os outros loucos de plantão, cuja maioria ainda nem foi dormir, o acompanhem neste gesto diferenciado de comunicação; cidadão que, às 6h30 da manhã, enquanto você caminha para tomar banho neste mesmo banheiro do djanho onde não há saboneteira, convida você a tomar um trago e cantar Raulzito com ele..."

"Hum..."

"Agora, senhor Salabim, o senhor entende por que, de todas as coisas que eu posso pedir neste mundo, uma saboneteira é a mais importante delas? Qualquer outra coisa que eu pedisse ou a soma de dinheiro qualquer não faria nenhuma diferença aqui. Não aqui e agora."

"Pois, meu caro reclamão, Salabim não lhe dará nenhuma saboneteira. Quem mandou vir para cá? Tivesse ficado em casa..."

É então que sou despertado pela água fria que começa a sair do chuveiro, quando devia estar quentinha. E eu que estava esperando tanto por esse banho...

Sim, não há mais dúvidas sobre isso: eu estou ficando velho!



quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Boletim de Ocorrência/Queixa n°57689

Curitiba, 16 de fevereiro de 2008.

No dia de hoje, Maikon Augusto Delgado (26), possuidor de RG e CPF devidamente apresentados e comprovados, compareceu à 3ª Delegacia de Improprérios e Inverdades, situada na Rua dos Bobos, n° 0, e deu queixa contra Camilo Werner González, chamado pelo declarante de "meliante" e doravante neste documento como "acusado".

Segundo consta a prova apresentada (impressão de correio eletrônico recebido do impropreriante), o declarante teria sido acusado injustamente de "vadio" e "não-partícipe das bizarrices do mundo". O referido correio eletrônico, anexado a este processo a título de clareza, faz-se dito nas linhas abaixo:

estimados ana-abuelita, ana-carol e ana-bruno (digo, bruno!)

tradicionalmente, se bem ando um pouco avesso a essas tradições ultimamente, envio a maikon-mad-magoo mail com link para algum fato bizarro de nosso mundo que encontro em jornais mundo afora (os titulos desse mail são sempre o mesmo: our freek world)

em tempos gloriosos (leia-se, quando o bonsares postava como uma fabrica de fosforos emite fumaça) quase todo dia havia novo fato bizzaro. alias, por muito havia mais bizarisses do que noticias do blog. mas enfim...

fato é que acabo de me deparar com a noticia de um professor de universidade analfabeto! e, em seguida, com um anao indiano alterofilista!

em duas palavras: im-pressionante!

riam vcs tb em primera mão (a gente nunca sabe qdo o magoo vai colocar isso no blog.... alias, lembra do blog magoo?)
http://oglobo.globo.com/blogs/moreira/

saudações das 15h22 da tarde


Ultrajado, o declarante decidiu-se por denunciar o acusado e assim proteger-se, sob o augúrio da lei, de quaisquer crimes pelos quais possa ser incriminado futuramente. O mesmo declarante admite ser vingativo e disse, ipsis litteris, "...que sua vingança será maligna!". Como foi o primeiro a prestar queixa neste órgão governamental, o declarante, a saber Maikon Augusto Delgado, possui a proteção legal do artigo 45 da Constituição Desfederal de Assuntos Aleatórios e Desimportantes, § 3, e vê-se completamente exonerado de qualquer culpa referente a quaisquer outras acusações, de parte do acusado, e das acusações que fará contra o acusado. Tendo isto em vista, declarou o declarante:

De tudo o que ele me acusou, o pior foi o de "vadio". Aquele meliante, o qual não quero nomear por respeito ao ouvido do cão-tinhoso, afirmou que eu não lembrava mais do Blog Bons Ares e que não postava mais. Discordo em gênero, número e grau. E trouxe aqui para o senhor, senhor escriturário, a prova de que estou em dia com as minhas obrigações de pobre escrevinhador de coisas mundanas...

O declarante, exaltado, apresentou as outras provas que trouxera, elencadas a seguir: "Ai, Santo Grambel", postagem do dia 15 de fevereiro de 2008; "O jeito catarina de comprar macarrão", postagem do dia 7 de fevereiro de 2008; "Um dia de *m", postagem do dia 29 de janeiro de 2008; "Vossuncê tumém qué?", postagem do dia 24 de janeiro de 2008; "Butucaland", postagem do dia 19 de janeiro; "Quem disse que o bom de chuva é se molhar?", postagem do dia 13 de janeiro; "A volta daquele que vive querendo ir embora", postagem do dia 7 de janeiro de 2008. Afora as mais de 100 (cem) outras postagens que o declarante apresentou em sua defesa, escritas ao longo da vida útil do blog Bons Ares. O declarante continuou, pois:

E veja bem, meu senhor, se há cabimento numa coisa dessas. Tamanha injustiça contra a minha pessoa, que mal nenhum fez àquele meliante salafrário. E isso porque não quero entrar no mérito maior da vadiagem. O mesmo meliante, no começo do e-mail que me mandou, já afirma que "anda um pouco avesso a essas tradições ultimamente", o que me dá mais que margem de me defender dizendo que, ao passo que estou lá na labuta tirando histórias de pedras, lá está ele, perdoe-me a palavra, rascándose las pelotas às 15h22 da tarde, quando devia estar trabalhando, o que, a meu ver, é sinal inconstestável de vadiagem.

Mas não termino por aí. Porque ainda fui injustamente acusado de "não-partícipe das bizarrices do mundo". Disse o meliante que não posto mais a bizarrices que ele coleta na internet enquanto
se rasca las pelotas. No entanto, como ele mesmo afirmou, tem sido pouco avesso a essas tradições, o que comprova o fato de que o já mil vezes citado meliante não tem fornecido bizarrices ao blog, de forma que fica mais uma vez comprovado, na minha opinião, que o vadio é ele.

Além disso, ainda me manda um link de bizarrice de um professor universitário analfabeto, quando ele próprio, e aqui reincorporo o papel de Fiscal da Censura, que deveria ser uma obrigação do meliante, e o de Protetor dos Bons Costumes e da Boa Gramática, minha função sempre exercida, e impropero contra "o já mil vezes citado", já que seus erros de gramática, no e-mail, são inúmeros. Elenco: não põe maiúscula nas palavras, não acentua, não distingue verbo de substantivo e, para coroar, me escreve bizarrice com dois S, ou então com dois Z e um R. Um crime, meu caro senhor escriturário, um crime inafiançável.

De fato, "bizarrice" com dois S é crime e está descrito no artigo 5 do Código Penal dos Bons Costumes Gramaticais.

Não bastasse isso, excelência senhor escriturário, o meliante não faz bom uso das conjunções, as quais tenho certeza que não sabe reconhecer.

Para terminar e comprovar que não sou um "não-partícipe das bizarrices do mundo", tendo em vista que já provei que não sou vadio, afirmo que sou amigo do Zunga, e que isso já é mais que motivo para me fazer um amante dos seres gubúguicos e bizarros deste mundo, além do fato de suportar, durante longas períodos de tempo, o meliante cantando MC Catraca.

Findo o pronunciamento do declarante, dou fé e tenho dito.

Ass.: João Manuel Esteves Fonseca (escriturário da 3ª Delegacia de Impropérios e Inverdades).


A MINHA VINGANÇA SERÁ MALIGNA!



sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Ai, Santo Grambel...

DDD 13, DDD 75, DDD 89, DDD 92, DDD 56, DDD 34, DDD 26, DDD 45... Eu, que nunca tinha ligado para nenhum lugar com esses DDDs antes, hoje fiz coleção. Um amigo de outras freguesias me pediu uma ajuda "nuns trens" dele e fui eu lá dar-lhe uma força e tomar um cafezinho acompanhado de bolo. Minha tarefa: fazer um levantamento de uma série de informações Brasil adentro (ou seria afora? vai saber!). E dá-lhe eu no telefone, discando aquela montoeira de números e falando com seres tupiniquins dos mais diferentes sotaques.

Desprevenido que estava eu, fui pegando o brinquedinho de se falar, comecinho da manhã, e mandando um 71 no grambel. Primeira ligação do dia. Só foi o cidadão que me atendeu soltando a dita: "Arre, bom dia!". E mais depois emendou: "Ô rapá, guente um pouquinho que já lhe avejo isso!". Muito embora ele não tivesse conseguido responder nenhuma das minhas perguntas, com que satisfação que eu desliguei o telefone! Só o sotaque e a prontidão do sujeito já tinham valido aquela ligação tão cara.

Entusiasmado, encarei o segundo telefonema do dia. Emendei um 85 no grambel e foi só alegria. Depois de um pouco de conversa, meu interlocutor solta a seguinte: "Marrapanhinho, que pergunta porreta que tu me fez, num sabe?". Satisfação demais, sô.

Já lá pelas tantas, passada a décima quinta ligação da manhã, DDD 75, uma mulher me atende do seguinte jeito: "Diga, meu amooor, o que é que você quer?". Mas ela falou com tanto carinho comigo, com tanta afeição que não pude pensar em outra coisa que no fato de como a informalidade é regra nesse Brasilzão véio sem porteira.

Foi aí que liguei para um 90 e poucos. Cu do mundo mesmo. Um tantinho de conversa e a menina que tinha me atendido, de quem eu já meio que sabia da vida toda, me disse: "Oxe, seu sinhô, vou te passar para alguém mais sabidurido que possa te ajudar..." Sabidurido? Satisfação, satisfação!

Nas horas seguintes, foi só uma avalanche de "satisfações":

"Oxe, bichim, de tão longe qu'ocê tá ligando?"

"Ai, estimado, não desligue não!"

"Ai, diga assim não, que até tô avexada com tua simpatia..."

Eu, educado que fui pela minha santa mãezinha, tive que agradecer, né?



quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

O jeito catarina de comprar macarrão

Façamos um rápido exercício mental: imagine-se comprando macarrão. Como seria? Acho que 99% de vocês diriam que se imaginariam indo ao mercado, dirigindo-se à seção de massas e afins, que se veriam de pé na frente da prateleira de macarrões escolhendo aquele da sua preferência (uns vão pelo preço, outros também). Uma vez escolhido o dito cujo, vocês o pegariam, o jogariam no carrinho e iriam em direção ao caixa. Poriam o pacote sobre a esteira, a caixa o passaria pelo detector de rótulos, sairia o preço na telinha do computador, ela o jogaria para o final da esteira, onde vocês, muito solícitos, o colocariam dentro de uma bolsinha plástica e o jogariam novamente no carrinho.

Se não me enganei, muito provavelmente essa é a maneira que muitos de vocês se imaginariam comprando macarrão.

Aqui em Navegantes, no entanto, existe uma outra maneira de comprar macarrão. Você não precisa ir necessariamente ao mercado. É o macarrão que vem até você. Sim, senhores. Se Maomé não vai até a montanha, então a montanha vem até Maomé. Ou, em outras palavras, o macarrão vem até vocês. Fantástico, não? Eu pelo menos achei.

Imaginemos, pois, a minha pessoa, que, por incrível que possa parecer, está emagrecendo, acordando às 7h30 em uma terça-feira nublada e chuvosa. Me levanto, me espreguiço e tomo uma ducha para acordar (hábito meu adquirido desde muito). Já limpo, vou à cozinha, esquento água e passo um cafezinho para mim mesmo. Me preparo um pão no Tostex (alguém sabe o nome verdadeiro desse eletrodoméstico abençoado por Deus e bonito por natureza?) e me sento na varanda para tomar o meu café-da-manhã. A chuva continua caindo, molhando a grama, que exala já aquele cheiro de terra molhada.

De repente, no mesmo momento em que eu estava abocanhando um pedaço generoso de pão com mortadela catarina (a melhor do mundo!), uma moto pára na frente do portão. O motoqueiro dá uma buzinada e fica olhando para mim com cara de quem quer ser atendido. Eu, que não o conheço, me levanto muito matreiramente da cadeira e grito: “Opa!”. O motoqueiro me opeia também e, gritando desde o portão, me pergunta se quero comprar algo. Eu lhe pergunto o que ele tem para oferecer, e ele responde, ainda gritando, que tem tudo fresquinho ali na garupa, desde pão a macarrão, passando por nhoque, lasanha e afins. Quê?, penso lá eu com os meus próprios botões. Ouvi certo? Tem um motoqueiro na frente de casa, às 7h55 da manhã, debaixo de chuva, perguntando se eu quero comprar macarrão fresquinho? Caraio!

E de fato tudo isso estava acontecendo e a minha mente não estava me pregando uma peça. Respondo que muito obrigado, que eu não queria nada, mas não deixo de ficar surpreso com o acontecido. Muito embora eu seja catarinense de nascimento e de coração, não posso deixar de dizer que os catarinas são uns bichos muitos estranhos...

Obs.: Parsa Brusquense, por mais que eu não saiba direito por que, isso tudo me fez lembrar muito de ti.



terça-feira, 29 de janeiro de 2008

Um dia de *m

Manhã. Acordo com o intuito de, durante o período da manhã, agilizar algo a respeito de trabalho com um contato meu. Ligo para H., pergunto se posso passar em seu trabalho para cumprimentá-lo e ver como ficou um livro no qual trabalhamos juntos (H. é o autor; eu fui o revisor). Detalhe importante: por mais que já tenha trabalhado com H., já tenha recebido dele e trocado uma série de e-mails, nunca o conheci. Facilidades do mundo moderno, onde você pode trabalhar em casa apenas com seu laptop e internet. Bom, eu sou um deles, como todos já sabem: tradutor e revisor freelance home office.

Independentemente de tudo isso, como já disse, ligo para ele e marco de passar por seu trabalho dentro de meia hora. Saio de casa.

Quando, procurando o local a pé, me deparo com algo grande no final da rua e bem escondido atrás de umas árvores. Do lado, uma empresa de caminhões, entregas ou algo do gênero. O dito local, à medida que vou me aproximando, vai tomando forma e, diga-se de passagem por ser muito importante, cor. Sim! Muita cor. Quanto mais caminho e me aproximo, mais vou ficando surpreso com o que vou vendo. Paredes amarelas, pilastras azuis, detalhes em vermelho e uma série de detalhes cujo significado desconheço.

Estando já no final da rua, de frente para o muro e as grades do local a que tinha que ir, posso finalmente ver tudo com detalhes. O lugar onde H. trabalha é uma *lm. Mas não uma qualquer. A maior do estado. A sede principal de todas, segundo o que me disse ele depois.

De qualquer forma, voltemos a eu de frente para o portão. Estou eu lá fora, olhando para as grades, os amarelos das paredes, os azuis das pilastras e os vermelhos dos detalhes. Fico pensando com os meus botões como é que faço para chamá-lo lá dentro, já que não havia um interfone, uma guarita nem nada. Observando mais atentamente, encontro, do lado direito, meio escondido, um interruptor de campainha. Toco, mas nada ouço. De repente, ainda sem ter ouvido nada, o portão elétrico se abre sozinho. Penso: “Puta merda, onde é que eu fui me meter?!”. Meio que automaticamente, resolvo entrar sem pensar nem temer muito. O melhor a fazer, se você está em dúvida se sua vida corre ou não perigo, é não demonstrar medo e agir como se durante toda a sua vida você tivesse feito aquilo. E foi o que eu fiz.

Passei a soleira do portão e entrei no estacionamento, cujo pavimento era de paralelepípedos. Haveria algum significado oculto e especial por trás da escolha das pedras? Sei não. Ainda sem muito bem saber o que fazer, procuro o lugar para onde devo ir. Fico em dúvida. Será que devo ir diretamente à porta principal, alta, imponente, ou será que devo procurar a porta dos empregados e meros mortais? Como não vejo a dos empregados e julgo que ficar fuçando no terreno alheio pegaria pior que simplesmente ir até a porta principal e tentar abri-la girando a maçaneta, faço o que acabei de descrever. Meio com medo, é claro. Mão na maçaneta, giro-a e, para o meu espanto, abro a porta. Eu esperava que ia haver algum procedimento misterioso, algum segredo ou manha que eu ia ter que aprender para entrar, ou até quem sabe passar por algum questionário obscuro feito por algum porteiro anão, mas nada. Giro a maçaneta e a porta se abre como se fosse a porta da minha despensa. Frustração? Desilusão? Pior: preocupação. Mais sinistro que encontrar com um porteiro anão, é encontrar porteiro anão nenhum. Mas mesmo assim eu entro.

Uma vez dentro, vejo que o interior não tem nada a ver com o exterior do lugar. Enquanto fora é colorido, dentro é tudo cinza. O piso é de lajota cinza, as paredes de gelo. Um ambiente bem austero, poder-se-ia dizer. E, para piorar a sinistrice, não encontro ninguém ao entrar. Era inevitável que eu pensasse: “Mas quem é então que abriu a porta para mim?”. De repente, como que do nada, sai um homem mais velho, barrigudo, e me cumprimenta. “Oi”. Eu, sempre tentando ser muito simpático, digo aquele meu “opa” de costume. Ele diz “opa”. Eu digo “Gostaria de falar com o senhor H”. Ele responde um “Vou ver se ele está aí”. Eu emendo “Acho que sim, porque marquei com ele”. Ele manda um “Vou ver”. E vê, e H. está e o homem barrigudo me mostra o caminho para chegar até H. “Suba a escada, vire à direita, mais uma vez à direita em um corredorzinho (hum..., corredorzinho!, penso eu) e pegue essa passarela que está em cima da sua cabeça”. Passarela? Sim, passarela. E, olhando para cima, verifico que de fato, mais uma vez para meu espanto, há uma passarela, e dentro do prédio! Sinistro!

E vou eu lá. Subo as escadas, viro à direita, viro à direita de volta, pego o corredorzinho, pego a passarela e chego a uma sala, de onde estava saindo um outro homem, de mais idade. Era H. Só podia ser H, mas mesmo assim me apresento: “Bom dia, estou procurando o senhor H.” “Sou eu”, responde H. E finalmente nos encontramos.

E começamos uma conversa que acabou durando quase duas horas. Em primeiro lugar, H. me mostrou seu filho e meu afilhado (o livro no qual trabalhamos juntos). Me contou todos os problemas que teve para imprimi-lo (problemas por conta da diagramadora), etc. Em seguida, enveredamos para assuntos mais específicos. H. me falou um pouco de sua trajetória profissional, perguntou da minha... Até que entramos no assunto de *m. Muito falamos e pouco entendi. E nenhum dos mistérios referentes àquele lugar que eu já tinha elencado na minha cabeça foi solucionado. Muito pelo contrário até. Pelo que puder entender, na *m quanto mais mistério houver e se puder fazer ao redor de um assunto, mais iniciático e supostamente profundo é o conteúdo por trás do mistério.

Eu, que pouco sabia de *m à exceção do que li no livro que revisei dele, só fiquei dizendo “Sei, sei” e tentei assimilar todas as informações que ele ia me passando. Informação e sabedoria nunca é demais, já dizia meu velho pai.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

Vossuncê tumém qué?

São 13h15 e tem meia hora que Tião, depois de vasculhar o lixo da vizinhança, empanturrou o bucho de uns restos de arroz, feijão e salada, azedos, que encontrou. Satisfeito, estacionou sua carrocinha sobre a calçada, debaixo de uma árvore, e se ajeitou na boléia enquanto sua égua Parruda começou a atacar o matinho. Cruzou as pernas, pegou uma folha de papel almaço já rascunhada que recuperou do mesmo lixo, um pouco de fumo do bolso da calça, enrolou um palheiro e brasa. Queria disfrutar do primeiro mormaço da tarde e da lombeira do almoço. Descanso merecido para Tião e sua égua.



sábado, 19 de janeiro de 2008

Butucaland

Sempre partícipe desta intrépida tarefa de reinventar o mesmo, fui passar uns dias na Ilha do Mel, aonde não ia há anos. A última vez tinha sido com Barbosa, Céline e Ariana. Desta vez, no entanto, com Duim.

No frisson de uma conversa de bar regada a narguilé em uma quarta-feira de madrugada, Duim tem a grande idéia: "Vamos para a Ilha?" Eu, sempre de prontidão e daquele meu jeitão, respondo: "Mas só se for agora!". E fomos bem cedinho. Não passava das 9h já estávamos lá molhando os pés na água e se preocupando em não voltar vermelho de queimado para casa. Eu pelo menos me cuidei, peguei uma cor e ainda não me queimei. Ponto para mim!

E, ainda tomado pela intrépida tarefa, pedi que Duim me levasse a lugares que eu ainda não conhecia. Ela me levou à Gruta e à praia do Nhô Jeca, que, diga-se de passagem, vaut le coup! Pena não termos foto de lá.

Mas a maior experiência de todas foi o nosso encontro com o monstro da Gruta. Era um serzinho desprezível, meio peludo, meio barrigudo (de cerveja, de cerveja) que veio vindo em direção à câmera com seu andar mambulenque e tentou nos atacar. Por sorte, nossa destreza foi maior e conseguimos fugir das suas garras. Um registro foi feito, para não dizerem depois que sou um mentiroso. Confesso que desconfio que haja alguma conexão internacional com nosso grande e impiedoso inimigo Pato-Perro. O cramunhão sempre está presente.

E para depois não me dizerem que tiveram pesadelos de noite, uma fotinho mais feliz!


Shots taken directly from Butucaland by Duim, the courageous girl!




domingo, 13 de janeiro de 2008

Quem disse que o bom de chuva é se molhar?

Hemos de convir que deslumbrar-se com o sempre igual não é das tarefas mais fáceis. Vai fazer um mês que estou de volta à terra tupiniquim e sinto que já vi e fiz tudo o que podia fazer e que as coisas já estão começando a se repetir.

Querendo evitar isso, estou tentando reinventar minha estadia no Brasil e na cidade onde quase sempre morei. Fico me forçando a ir a lugares a que nunca fui, a tomar caminhos que nunca tomo para variar os trajetos, a reencontrar pessoas que há muito não vejo, a conhecer pessoas novas, a conversar de assuntos que normalmente não converso, a deixar que puxem papo comigo na esperança de ser supreendido. Às vezes sou, às vezes não.

Sendo assim, ontem fui ao Parque Barigüi com um amigo das antigas vê-lo praticar Trikke. Chegamos, fomos para a pista de automodelismo e ele me mostrou como funcionava o brinquedinho. Muito divertido. Parece difícil, mas não é. Dá para pegar o jeito em um dia, imagino eu. Lá, acabamos encontrando com um conhecido das antigas, contra quem jogamos hóquei. Nosso timeco de merda (sim, eu jogava hóquei quando era mais novo, assim como patinava) contra o time semiprofissional onde ele jogava. É claro que levamos um coro, ainda mais porque eles jogavam com o disquinho (tinham uma pista lisa o suficiente para isso), enquanto nós estávamos acostumados a jogar com a bolinha (porque jogávamos em qualquer quadra de futebol, com ou sem buracos. Não que a lavada que levamos possa ser justificada por isso, mas também não deixa de ser.

De qualquer forma, conversamos sobre patins, trikke e afins mais de hora e fomos ao que tínhamos ido. Eu caminhar ou correr ou sei lá o quê (confesso que o pançudo aqui tinha levado um livro para ler - O inventor da solidão, de Paul Auster) e o meu amigo a praticar o trikke (quem faz trikke trikeia? vai saber!). Mal tínhamos percorrido 300 metros na ciclovia fomos surpreendidos por uma tempestade. Não foi uma chuvinha de merda. Foi um pé-d'água que há tempos não via. Tivemos que nos abrigar em um quiosco e, por estar lá e eu já com fome, a fazer uma boquinha. Mas bah, diriam vocês: foi fazer exercício e acabou só aumentando a massa adiposa que teima em não querer abandonar esse lindo corpinho que você tem! Ah, muito obrigado pelo elogio que me toca.

Continuando, contribuí sim para o aumento, pequeno, quase imperceptível, do meu brioche. Ele agradece, minha estética já não tanto. E foi que nos vimos, dois quase atletas querendo esculpir seus corpos (o meu, no caso, muito lindo), sentados esperando a chuva passar. E foi que me vi observando as pessoas que também estavam lá no quiosco. Havia, como era de se esperar, uns tanto que estavam ali fazendo a mesma coisa que nós. Esperando a chuva passar. No entanto, outros que não. Em especial, havia um casal que me chamou muito a atenção. Ele, típico vileiro curitibano (calça jeans cheia de balacubacos bregas que só vendo), ela, também vileira, com aquela pinta de "não olha muito que te 'ranco os dentes, piá".

Eu, muito na minha, fiquei só de zoio nos dois.

Embora não quisesse muito, tive que observá-los: era muito engraçado os dois juntos. Era nítido que não tinham ido ao parque para fazer esportes. Era nítido que não tinham se protegido lá no quiosco para não se molharem. Mas, então, o que é que os dois estavam fazendo lá? Namorando, uai, sô. E por que cargas d'águas os dois foram namorar bem ali? Para ver os patinhos nadando no lago que não! Nem para ver o bonito que é as aves voando. Então para quê? E não é que os dois estavam assim de mãos dados. Não, estavam se amassando forte, sem o menor pudor. Conclusão a que cheguei? Que, ao contrário do que tinha pensado antes, foram lá se proteger. Mas não porque não podiam fazer exercício, e sim porque queriam é dar uma e não estavam podendo. Primeiro porque começou a chover, e segundo porque, por estar chovendo, não rolava se sujar lá no meio do mato. Dar uma no matinho molhado é foda!

E é assim que foi: eu e asperar a chuva passar e os dois loucos da vida por não poderem dar uma. Ê vidão, ê lá em casa!



segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

A volta daquele que vive querendo ir embora

Nossa querida Argentina ficou para trás. Melhor dizendo: continua no mesmo lugar, nós é que a abandonamos. A partida foi uma odisséia digna de ser narrada por Homer(o).

Durante a última semana, as preocupações foram mil: resolver tudo referente ao aluguel de Little Horse; combinar com o novo dono da geladeira de ele vir buscá-la; vender mesa de vidro e o que mais desse da cozinha; vender os respectivos móveis próprios (meu colchão de casal foi dado para Ariana; a mesa, cadeira e cubos do Camilo vendidos a uma amiga dele; todo o resto, incluindo quase tudo, foi levado por ela); dar os resquícios de louça para Nena; entregar os alguns quilos de fotocópia para Jorgelín; vender
mi equipito de sonido para la compu para o mesmo; encerrar a conta da internet e entregar o módem na loja; encerrar contas dos celulares; despedir-se de todos os amigos... Em suma, semana corrida.

Para o último dia, duas coisas tinham ficado pendentes e não poderiam não estar pendentes: realizar o ritual de devolução da casa para o maleta da imobiliária e ir para a rodoviária. Já tínhamos combinado com o funcionário de vir meia hora antes de irmos e com o motorista do frete (isso mesmo, precisamos de um frete para levar tudo!) para nos buscar na hora que tínhamos que ir.


O funcionário vem, treta com algumas coisas como era esperado e por fim assina a devolução. Descemos tudo para o saguão e, já suando como porcos, esperamos que nosso frete chegasse.


Descemos com 5 minutos de antecedência. Espero 5 minutos até o horário marcado. O frete não aparecia. Mais 5 minutos, e nada de frete. Mais 5 minutos e ainda nada. Nós, sabendo que precisávamos estar na rodoviária com pelo menos 1 hora antes do embarque, para despachar a pouca quantidade de malas que tínhamos, começamos a ficar preocupados. 20 minutos atrasado e resolvemos ligar perguntando. A atendente disse que ele estava por chegar. 35 minutos atrasado, chegou o frete com aquela cara de cu de sempre... Embarcamos tudo na parte de trás, eu perdi no par ou ímpar e acabei tendo que ir atrás, e assim fomos.


Não bastasse ter chegado atrasado, o motorista ainda resolveu pegar o pior caminho possível para chegar em Retiro. Já na saída de casa pegamos engarrafamento (justamente neste dia havia greve do metrô). Indo pela Hidalgo, pegamos a Avellaneda e fomos embora. Lá pelo centro, ele resolveu entrar na Corrientes. Fatal: outro engarrafamento, ainda maior que o primeiro. E nós, que havíamos pedido o frete com muita antecedência para não chegarmos tarde, acabamos chegando na rodoviária às 11h25. O ônibus saía às 12h. Detalhe a não se esquecer: tínhamos que desembarcar todas as malas só nós dois, pesar, embarcá-las no despacho e ainda comer. Correria total.


Depois de uns 20 minutos levando mala e mais mala escada abaixo até o guichê da empresa e já completamente suados disso tudo, Camilonga, com sua lábia eterna, se põe de pé do atendente para acompanhar tudo. A quilagem de nós dois: 190kg. Exatamente isso. Quase 200kg de bagagem, isso sem contar as de mão, onde tinha pelo menos mais uns 30kg. A passagem de cada um dava direito a 30kg para levar, de forma que podíamos descontar 60kg dos 190kg. Os outros 130 eram excesso. Facada no rim. Mas foi para isso que Camilonga de la Croix tinha se aprochegado do atendente. Conversê para cá, conversê para lá, Camilo e o atendente entraram em um acordo: o atendente diria que não tínhamos excesso de bagagem e nós lhe dávamos 80 pesos pela maracutaia. Nós economizamos 50 pesos, o atendente ganhou 80 e a empresa, que era uma bosta mesmo, ficou sem nada. Azar dos burros, sorte dos espertos.


Já dentro do ônibus, o lance era tentar relaxar naquele Pluminha de merda convencional, onde ficaríamos, em tese, as próximas 30 horas. Acabaram sendo 37h: atrasamos 1 hora para sair, outras duas na fronteira por conta de uma jeca do mato, outras 3 porque o pneu furou e outra aí nas tantas idas e vindas pelas garagens da empresa. Querem um conselho? Nunca em suas vidas peguem a Pluma. O Camilo tinha me avisado, mas eu não lhe tinha dado ouvidos.


Por fim, na madrugada do dia seguinte ao seguinte, chegamos em Curitiba. Uf! Viagenzinha cão.


No dia seguinte, começou tudo: encontro do Clube do Bolinha, futebóis no Cachorródromo, idas à Cachoeira da Curva (secretíssima) e à de Witmarsum, cafés-da-manhã, almoços e jantares com amigos, cineminhas... Por sorte, uma inifinidade de coisas.


Chegou o Natal e aquela comilança de costume. Chegou o Ano Novo, tranqüilinho este ano também, o qual passei entre amigos.


Aí vem a entrada de novo. Um ano estranho, há de se dizer. Começou já muito diferente do que eu havia planejado. As forças cósmicas advindas de sabe-se lá onde foram mais fortes que a minha organização. Tudo ficou virado do avesso, e assim estou. Questão agora de se desvirar. Vai levar um pouco de tempo, mas desviro.

Sensação de voltar para o Brasil? Sinceramente, muito estranha. Ao mesmo tempo em que é tudo muito familiar, tudo também é muito estranho. Às vezes me sinto um peixe fora d'água. Por motivos mil... Desafio atual? Tentar encontrar o estranhamento naquilo que sempre foi o mesmo. É assim, então, que vos deixo com as palavras de um dos tantos sábios da montanha jogados por esse mundo afora:

“Estrangeiro (e estranho) é quem afirma seu próprio ser no mundo que o cerca. Assim, dá sentido ao mundo, e de certa maneira o domina. Mas o domina tragicamente: não se integra. O cedro é estrangeiro no meu parque. Eu sou estrangeiro na França. O homem é estrangeiro no mundo.” (Vilém Flusser)

Saludos a todos.